sexta-feira, 13 de julho de 2012

ELE ELA - AS CONFISSÕES DE PAUL McCARTNEY

De todas as matérias que já publiquei aqui na coluna “TESOUROS DO FUNDO DO BAÚ” ou “ARQUIVOS SECRETOS” (nunca consegui definir), a que eu mais gostei de fazer foi esta! Aliás, ela já era para ter sido publicada há algum tempo, mas toda vez que olhava para ela, achava grande demais e me dava uma preguiça danada. Mas esta semana resolvi encarar. A belíssima matéria “As Confissões de Paul McCartney”, foi publicada originalmente no Brasil na finada revista ELE ELA nº 29 de outubro de 1972. É absolutamente sensacional, abrangente e esclarecedora sobre o início do vôo de Paul McCartney em sua carreira solo. Um verdadeiro documento histórico que a gente confere agora com absoluta exclusividade do Baú do Edu. Espero que gostem. Boa leitura, abração!
Até que ponto uma mulher pode mudar a vida de um ídolo? Por causa de Linda Eastman, Paul McCartney rompeu com os Beatles e desapareceu por completo do público. Depois de negar-se, durante três anos, a conceder entrevistas, ele concordou em falar a uma repórter de Londres, Anne Nightingale. Na entrevista, aqui reproduzida com exclusividade, Paul dá a sua versão sobre a famosa briga com John Lennon, que teve Linda como pivô e pôs fim ao maior fenômeno de sucesso do século.
NINGUÉM sabe de fato quando a união de John, Paul, George e Ringo começou a andar para trás. Mas os sinais de desentendimento apareceram muito tempo antes de Paul McCartney finalmente anunciar: "Estou saindo." Desde então ele vinha se recusando a falar sobre a sua vida com os Beatles, e passou a levar uma existência quase reclusa. Mas agora resolveu ceder e concordou em se abrir, numa das primeiras entrevistas que concede em mais de três anos.
Do seu pequeno escritório localizado no último andar de um velho edifício de Londres, onde trabalha uma secretária — reduz-se a isso a sede da McCartney Productions — Paul mandou-me uma mensagem para encontrá-lo num clube no bairro de Hampstead. Era o tipo do lugar que parecia nunca ter visto a luz do dia. Tão deprimente como uma boate visitada à tarde, cheio de mesas e cadeiras vazias, e com um minúsculo palco. Paul havia alugado aquele clube para os ensaios do novo conjunto que formou, Wings (Asas). O local lembrava aqueles em que os Beatles tinham começado. Como The Cavern em Liverpool, ou o Star Club, de Hamburgo. Ele não estava lá quando eu cheguei. Seu conjunto, formado por Denny Laine, ex-membro do "The Moody Blues", Henry McCulloch, ex-Grease Band de Joe Coker, e Denny Seiwell, baterista que Paul descobriu na América, estava afinando os instrumentos. Um outro estava sentado atrás do painel de mixagem ao fundo do clube, procurando obter um som perfeito do complicado equipamento eletrônico. Quarenta e cinco minutos depois, Paul McCartney entrou. Fisicamente, um homem muito mudado. Nenhum sinal mais do estilo de cabelo "beatle", ou mesmo do cabelo longo que virou moda a partir dos Beatles. Ao contrário, o cabelo de Paul era curto, "penteado para trás. Vestia um estranho casaco listrado de "nylon". E junto com Paul entrou Linda, sua mulher, a moça que aparentemente e misteriosamente mudou sua vida e manteve a vida privada de ambos em completo segredo. Uma vitória desse gênero requer certa determinação, coisa que está claramente estampada no rosto dessa loura ex-fotógrafa de Nova Iorque. Pela mão ela trazia a pequena filha do casal, Mary, de ano e meio.
— Esta é Anne — disse Paul à garotinha. — Diga alô.
—Alô, Denny — disse Mary.
Deixamos por isso mesmo. Bem, esta é Mary Mac — disse Paul, afagando a menina. A família McCartney é tratada entre os amigos como Os Macs.
Paul apanhou sua guitarra e saltou para o palco. E com ele foi Linda. Porque Paul transformou a fotógrafa Linda Eastman em Linda McCartney, letrista e compositora. A senhora McCartney tomou seu lugar ao piano. Uma ideia imediata do modo de vida dos dois era dada pela sua surpreendente aparência. Porque a mulher de um dos mais famosos compositores e cantores do mundo estava longe da sofisticação e do luxo que se poderia esperar. Não tinha maquilagem, e vestia o que parecia um hábito de frade comprado num bazar de segunda mão. Nos seus pés estavam curtas botas fora de moda, e, subindo até as coxas, longas meias de lã. Uma cinza e outra azul-marinho. Paul começou a cantar. Pela primeira vez num palco desde que os Beatles deixaram de aparecer em público quatro anos antes. E em vez de uma ruidosa audiência de garotas aos gritos, tocava agora para meia dúzia de pessoas silenciosas, espalhadas na penumbra de uma boate vazia. Em poucos instantes encheu o ambiente o som da voz familiar de Paul McCartney, "rocking and rolling" um dos velhos números de Little Richard de que mais gosta, "Lucille". Seu estilo não mudou, nem o jeito com que balançava a cabeça de um lado para o outro e sacudia a guitarra para frente e para trás. O número terminou. Houve silêncio. "Obrigado", disse Paul McCartney ao microfone. Novo silêncio. "Obrigado", repetiu mais alto, e desta vez o "público" entendeu e rendeu-lhe um discreto aplauso. Mary Mac era a única entusiasmada. "A gente de Londres é difícil de agradar", comentou Paul. E então, continuou ensaiando o repertório do primeiro de uma série de concertos que pretende fazer com o Wings.
E mesmo estes estavam sendo organizados de uma maneira muito discreta. Paul não queria nenhuma publicidade antecipada, nenhum clamor de fãs, nenhum espalhafato. Ele e os Wings planejaram chegar a um colégio ou uma universidade de surpresa e aparecer no palco tocando e cantando suas músicas.Porque Paul está realmente começando tudo de novo. Após uma hora de ensaio de novas e inconfundíveis composições de McCartney, Paul pulou do palco, sentou-se a uma mesa e se explicou. "As pessoas parecem pensar que eu me transformei num ermitão ou coisa parecida. Mas não se trata disso. Meu problema em relação aos Beatles, basicamente, era que tudo partia de mim. Eu ia à casa deles muito mais do que eles vinham à minha. E por causa disso sofri muita crítica depois. Os outros diziam:"ele nos empurrou para que viéssemos todos a fazer "Magical Mystery Tour". "Magical Mystery Tour", um filme musical que os Beatles fizeram para a televisão esperando obter espetacular sucesso, foi um dos seus maiores e raros fracassos. Recebeu severas críticas, e Paul McCartney disse na ocasião: "O problema de ser os Beatles, é de que todos os nossos erros têm que ser cometidos em público." "De qualquer maneira", continuou Paul, "Magical Mystery Tour" tinha sido apenas uma "ideia" minha, que eu achei que valia a pena tentar. Depois de tantas ideias minhas que haviam dado certo, que diabo, eu tinha o direito de errar uma. Mas não, era o culpado. Sempre fui o culpado. Então resolvi ficar em casa por uns tempos e ver se os outros me telefonavam." Ele riu. "E lá fiquei por dois anos, e ninguém ligou! Mas eu realmente não estava querendo mais me envolver muito. Pareceu-me mais sensato."
Mas a rixa mais séria que dividiu os Beatles foi a respeito de Allen Klein, ex-empresário dos Rolling Stones, e que John Lennon propôs como o novo encarregado das finanças dos Beatles. Desde que Brian Epstein morreu em 1967, ninguém efetivamente ocupou seu lugar como empresário deles. Eles próprios organizaram a Apple e escolheram os diretores da companhia. E foi nesse instante, quando pareciam unir-se de vez, que começaram a se separar.
A Apple, uma utopia que nasceu para dar aos artistas esforçados de todo gênero a oportunidade que as outras companhias gravadoras e demais integrantes do complexo industrial-cultural nunca deram, estava já escapando ao controle. Todo dia o edifício estava lotado de poetas, pintores, cantores, desenhistas, letristas, cineastas, escritores, todos querendo que os Beatles lhes estendessem a mão protetora. Na verdade, o quar-tel-general dos Beatles, em Savile Row, não tinha espaço para tanta gente, nem suportava o peso de tamanha avalanche de artistas desamparados.
Apple: uma maçã envenenada - Paul McCartney tornou-se notório então pela sua constante ausência do local onde devia estar sempre. Dizia-se que ele reprovava totalmente a maneira como a Apple era conduzida. E seu Mini de janelas vedadas raramente estava estacionado no parque da Apple, ao lado do Rolls Royce branco de John e das Mercedes de George e Ringo.
Somente no verão de 1968, Paul começou a aparecer com frequência na Apple. E isto para lançar Mary Hopkin com seu "Those Were the Days", gravação que Paul produziu e que foi sucesso no mundo inteiro. Ele descobrira essa cantora galesa depois de um tefonema da modelo Twiggy, que tinha visto Mary Hopkin num programa de calouros da TV. E, como então Paul era o único que permanecia solteiro entre os Beatles, imediatamente a imprensa insinuou um caso romântico entre os dois. Ninguém notou a loura fotógrafa americana de "jeans" e pés descalços que tirava as fotos de Paul. Todos estavam muito ocupados, na época, com a rumorosa ligação John Lennon - Yoko Ono. Assim, a amizade de Paul McCartney com Linda Eastman, divorciada, filha de um advogado de Nova Iorque, cresceu em segredo.
Mas, nesse meio tempo, John e Yoko encontraram Allen Klein. George e Ringo concordaram com John em que Klein era o homem indicado para tomar conta dos negócios dos Beatles. Paul não concordou. Ele queria o pai de Linda para empresariar o grupo. E bateu o pé. Impasse. Paul recusou-se a assinar com Allen Klein, e John, George e Ringo mostraram-se inflexíveis na sua escolha. Era a primeira vez que os quatro não fechavam na mesma opinião. Então seguiu-se uma disputa legal que culminou dois anos mais tarde com uma ação de Paul junto à alta corte para dissolver a sociedade dos Beatles. Um oficial de justiça, segundo Paul, ainda está examinando a papelada do grupo.
"Estou satisfeito de ter colocado as coisas nesses termos", diz Paul. "De outra maneira eu não teria feito nada. Há certas situações que não sei resolver pessoalmente. E esta era tão complicada que não havia outra saída. Eu não tinha como fugir. Lembro-me de que me sentia um prisioneiro. Queria apenas que eles me deixassem sair, deixar os Beatles, ir embora e formar um novo conjunto." "Procurei botar na minha cabeça, o tempo todo, que não era por causa deles. Eles eram legais, e são legais. O problema era a situação, que escapava tanto do meu controle quanto do deles. Quando eu propus que devíamos rasgar o papel que nos mantinha juntos, Allen Klein disse a eles que isso "criaria problemas fiscais", o que os deixou preocupados. Na verdade, se o contrato fosse rompido, então, oficialmente, todo o dinheiro viria para nós individualmente. E cada um decidiria depois o que fazer com o dinheiro."
"Allen Klein está OK para os outros, provavelmente porque ele pôs em ordem os escritórios da Apple e acabou com a multidão que se apinhava à porta, e também porque é um cara simpático para praticamente todo mundo. Eles me disseram: "Sejamos amigos e deixemos nossa gente cuidar dos nossos negócios" Parecia de fato a saída mais fácil. Mas não era. Este é o problema, era o meio mais fácil de enrolar as coisas ainda mais."
O caso Allen Klein afetou tão profundamente as relações entre os Beatles que a mundialmente famosa dupla Lennon & McCartney, responsável por quase todos os grandes sucessos do grupo, nunca mais voltou a trabalhar em parceria. John Lennon e Paul McCartney não falaram um com outro e nem sequer se viram por mais de dois anos. John levou a briga ao ponto de dirigir insultos a Paul através da imprensa, e incluiu uma música no seu último álbum, Imagine, obviamente endereçada ao seu ex-companheiro: "How Do You Sleep?" ("Como Você Dorme?"). Pôs em dúvida a integridade de Paul e insinuou que Paul nada fizera de bom artisticamente desde que os dois se separaram. E quando Paul McCartney publicou seu álbum “Ram”, cuja foto de capa o mostrava segurando um carneiro ("ram") pelos chifres, John Lennon respondeu com uma fotografia na qual reproduzia a mesma pose de Paul, segurando um "porco".
Paul vivia agora em reclusão. Casou-se com Linda e passou a levar uma vida exclusivamente familiar, com a mulher e a filha do primeiro casamento desta, Heather, agora com nove anos. Quando Mary Mac nasceu, Paul declarou que estava pensando em fazer gravações em casa, e foi como se ele tivesse dito que havia se retirado completamente da vida pública e do maldito showbizz.
O aperto de mãos em Nova Iorque - Agora ele admite - "Os últimos dois anos foram ruins. Temos estado doentes" (referia-se a ele e Linda). Seu modo de falar dá a impressão de que os problemas legais e financeiros que o aturdiram desde que se opôs à contratação de Allen Klein tiraram uma parte dele. Hoje é um homem muito diferente do jovem "beatle" bochechudo e alegre que tinha um sorriso e uma canção para cada um.
Mas apesar das divergências sobre a Apple e o empresário Allen Klein, e dos insultos que andaram trocando, Paul McCartney reatou recentemente relações com John Lennon. O sangue "beatle" parece ser mais forte do que tudo isso. "Foi em Nova Iorque", conta Paul. "E o fato de ter sido bastante tempo depois da crise que dissolveu os Beatles ajudou muito. Porque, naquela época, tudo era demasiado "público" e político. Se eu procurasse John, seria como se estivesse representando um papel numa lenda." "Seja como for, eu e Linda nos voltamos então para vê-lo. E foi uma emoção para mim. Havia mais de dois anos que eu não via John. Eis porque fiquei tão nervoso. A última vez que eu o vira fora à mesa de reuniões da Apple. Dissemos um ao outro: "Olha, não vamos ligar para nada do que aconteceu. Pudemos verificar que havia ainda boas vibrações entre nós. O engraçado de tudo é que John e Yoko se parecem muito conosco, Linda e eu." O encontro ocorreu pouco antes de Paul gravar sua controvertida "Give Ireland Back To The Irish" ("Dêem a Irlanda de Volta aos Ir­landeses.") Por causa de seu conteúdo político; a música foi proibida em todas as estações de rádio da Grã-Bretanha, e Paul tornou-se objeto de furor de ambas as facções da luta na Irlanda do Norte. Mas para John Lennon, conhecido pelas suas ideias políticas, a homenagem vocal do ex-parceiro à Irlanda causou boa impressão: "John e Yoko têm uma maneira de pensar semelhante à nossa", diz Paul. "Eles não gostam que a Inglaterra tome conta da Irlanda. Ou da Rodésia. Temos muitos pontos em comum com eles. Na verdade, gosto muito de John e Yoko."
Assim, após as rixas públicas, as acusações mútuas na justiça, as trocas de insultos pela imprensa, e as referências desastrosas de um ao outro em capas de disco, Paul e. John fizeram as pazes num encontro secreto. Em parte por causa dos velhos laços que os uniam, em parte por causa da consciência política partilhada por ambos.
Mas é improvável que isso os leve a trabalhar novamente juntos. Enquanto John Lennon procura adquirir a cidadania americana e dedica boa parte do seu tempo à atividade política, Paul permanece na Inglaterra e pretende apenas escrever música. "No próximo ano haverá muitos ovos de ouro." Com isso quer dizer que Paul McCartney não morreu com os Beatles, e que mesmo longe deles será capaz de criar e oferecer ao mundo os formidáveis "hits" que fizeram do seu nome, na década passada, uma lenda.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

TESOUROS DO FUNDO DO BAÚ - JORNAL DO BRASIL

Esse texto que a gente confere a seguir, foi publicado no Jornal do Brasil, no dia 22 de agosto de 1988. Foi escrito por um tal Thomas J. Meier e publicado originalmente no "The Washington Post".
Ringo Starr nunca lia um contrato antes de assiná-lo. George Harrison preferia conversar sobre música indiana do que sobre o vil metal. John Len-non, convencido de que os Rolling Stones estavam faturando mais, chamou o empresário dos rivais para administrar as finanças dos Beatles — só para vê-lo ser preso, alguns anos depois, por sonegação de impostos. E Paul McCartney, recusando as escolhas dos parceiros, empurrou seu próprio sogro como empresário do grupo.
Enquanto os Beatles estavam ocupados conquistando o mundo musical nos anos 60, eles pouco sabiam de suas finanças. E, durante dois anos, ninguém cuidou delas. A história destas complicações — e as tensões no interior do grupo — está contida no processo aberto pela Apple Records, a empresa do quarteto, contra suas antigas gravadoras, a Capitol e a EMI. Um tribunal de apelação abriu recentemente o caminho para um julgamento, marcado para o início do ano que vem, na Corte Suprema de Nova Iorque.
Os Beatles alegam que a Capitol vendeu secretamente ou desviou para o comércio varejista 19 milhões de discos, entre 1969 e 1979, o que lhes renderia mais de US$ 30 milhões em royalties. A demanda judicial tenta também forçar a Capitol a devolver as matrizes dos discos dos Beatles, uma preciosidade feita ainda mais valiosa pelo emer­ente mercado do compact-disc, que segundo estimativas da Apple, poderia render-lhes mais de US$ 100 milhões em futuras vendas.
A Capitol, filial americana da inglesa EMI, classificou as alegações da Apple de absurdas e disse que grande parte da batalha deve-se apenas a interpretações diversas do contrato dos Beatles. Toda esta polêmica remete à própria essência das relações de negócio entre uma companhia gravadora e seus artistas.
Se for vitorioso, dizem os especialistas, o processo poderia ter um impacto significativo na indústria do disco. E faria as gravadoras mais responsáveis por cada tostão faturado por cada grupo musical. Os artistas frequentemente evitam as disputas judiciais, temendo danos a suas carreiras.
As gravadoras também correm grandes riscos. Mais de 3/4 de todos os álbuns dão prejuízo. Mas quando um disco cai no gosto do público pode ser uma mina de ouro. No ano passado, as vendas de discos de vinil e compact-discs chegaram a US$ 5,6 bilhões nos Estados Unidos e a US$ 16 bilhões em todo o mundo.
Conseguir melhor participação nos royalties pode representar milhões para um conjunto de sucesso. Mas muitos dos grupos campeões de vendas, particularmente os que começaram nos anos 60, em pleno flower power, tiveram que aprender pelo caminho
mais duro. "Era um pântano", lembra Elliot Hoffman, veterano advogado que foi conselheiro da Virgin and Island Records. "Nos velhos tempos, as gravadoras costumavam fazer contratos verbais. Hoje existem artistas cujos contratos estipulam auditorias nas cifras de vendas e nos custos de produção."
A riqueza dos Beatles é notável, se considerarmos seu escasso interesse nas finanças nos anos iniciais. Seu primeiro empresário, Brian Epstein, dava-lhes apenas US$ 80 por semana. "Parece uma piada", comentou George Harrison. "Basicamente, o trato era que receberíamos uns trocados por semana e as despesas correriam por conta dele."
O acordo que Epstein faria com a EMI/Capitol dava grande margem de manobra à gravadora — um ponto melindroso no atual processo. Pelo primeiro contrato, os Beatles tiveram que receber menos de US$ 0,10 por cada álbum vendido com êxitos como Hards day's night e Rubber soul. O tópico mais quente da disputa judicial, no entanto, é a acusação da Apple de que a Capitol mentiu ao dizer que discos do Beatles eram triturados, refundidos e então reprensados como novos discos. Em vez disso, segundo a Apple, eles eram vendidos ou dados a donos de lojas como brindes, para ganhar espaços nas vitrines para outros artistas da Capitol.
Todo esse processo está sendo acompanhado atentamente pelos advogados de todos os artistas de sucesso. Assim como os Beatles ficaram multimilionários à medida em que ficaram mais astutos nas questões financeiras, muitos músicos de hoje cercam-se dos melhores assessores jurídicos e econômicos na hora de assinar cada contrato.
"Nós notamos que os intérpretes e compositores estão se tornando bem mais sofisticados em relação ao lado comercial de suas vidas", diz Robbin Ahrold, executivo da EMI, a maior associação de compositores do mundo. "As pessoas criativas de hoje estão muito mais conscientes em relação à confiabilidade e responsabilidades dos contratos."
Mas mesmo atualmente Ringo Starr diz achar a indústria musical um enorme mistério. "Eu nunca me interessei", garante ele. "Sou um músico. Meu negócio é ir para o estúdio, fazer minha parte. Do resto que os outros cuidem. Até hoje não sei, quando faço um disco, como ele acaba terminando nas prateleiras das lojas."